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O consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil | Colunista

O consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil | Colunista

Entre os meses de abril e maio de 2020, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) coletou informações para averiguar como estava o comportamento do brasileiro durante a pandemia de covid-19 e o item alimentação apresentou um resultado desanimador. 

O estudo mostrou queda de 4,3% no consumo de verduras e legumes em 5 dias ou mais por semana; e aumento de 4,6% no consumo de pratos prontos congelados, de 3,7% no consumo de salgadinhos de pacote, e de 5,8% no consumo de chocolates e doces em dois dias ou mais na semana.

Embora existam políticas públicas direcionadas a minimizar a ingestão de alimentos não saudáveis, a pesquisa apenas reafirmou a crescente tendência que existe sobre o consumo desse tipo de alimento.

1- A mudança no padrão alimentar brasileiro

Preços acessíveis, praticidade alimentar e fácil disponibilidade aliados ao trabalho de marketing massivo dos produtos, foram os grandes responsáveis pela elevação do comércio dos alimentos ultraprocessados no país.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a aquisição média per capita dos alimentos industrializados foi de 2.560 kg entre 2002-2003, para 3.992 kg no período de 2017-2018, representando um aumento de 56%. 

O processo de substituição das preparações culinárias e tradicionais pelos alimentos ultraprocessados ocorreu de forma gradativa, em consonância com as transformações socioeconômicas que aconteciam no país, pois, quanto maior a urbanização, a renda per capita e o incentivo fiscal fornecido às empresas estrangeiras para se instalarem em território nacional, maior é o consumo desses alimentos.

2- Efeitos para a saúde humana

Os alimentos ultraprocessados são altamente irresistíveis, viciantes e de longa validade, porém nada nutritivos. Na verdade, possuem alta densidade energética e desequilíbrio de macro e micronutrientes, com destaque para o excesso de carboidratos simples, sódio e gorduras, e quantidade insuficiente de fibras e potássio. 

Estudos têm apontado a relação direta entre o consumo de alimentos industrializados e o surgimento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), as quais ainda potencializam as complicações e a letalidade do coronavírus. 

Sendo assim, em 2007, as DCNTs foram responsáveis por 72% das mortes que ocorreram no país e, em 2020, durante a pandemia, de acordo com o Ministério da Saúde, dos óbitos contabilizados até a Semana Epidemiológica 14, em 61,1% havia pelo menos uma comorbidade, sendo cardiopatia e diabetes as de maior incidência entre os maiores de 60 anos e obesidade nos menores de 60 anos.

No Brasil, a ingestão excessiva dos alimentos ultraprocessados está associada à maior prevalência de dislipidemias em crianças, síndrome metabólica em adolescentes e obesidade em adultos.

4- Consequências sociais, econômicas e ambientais da produção 

Para o desenvolvimento desses tipos de alimentos são usadas matérias-primas oriundas de monoculturas que, caracterizadas pela necessidade de grandes quantidades de terra, água e combustíveis para o plantio ou criação de gado, utilização intensa de tecnologia agrícola, como maquinários, sementes transgênicas e agrotóxicos, são responsáveis pela degradação da biodiversidade local. 

Ademais, a cadeia produtiva dos produtos ultraprocessados fortalece os problemas de desigualdade fundiária, do desemprego e da violência no campo, que intensificam a migração da população do campo para a periferia das cidades, um processo denominado de êxodo rural. 

Outrossim, também contribui para a redução do sistema de agricultura familiar que, ao suprir as demandas alimentares do mercado interno, propicia a geração de emprego e renda entre a população local, causa menor impacto ambiental e atua na preservação da cultura alimentar brasileira.

5- Principais políticas públicas direcionadas à promoção da alimentação saudável

Para ser capaz de promover uma alimentação adequada, saudável e sustentável entre os brasileiros, o nutricionista precisa, antes de tudo, conhecer as principais políticas alimentares em vigor no Brasil, para então, acompanhar e zelar pela implementação e manutenção de cada uma delas:

  • Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN): a Lei nº 11.346/06 cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) “por meio do qual o poder público, com a participação da sociedade civil organizada, formulará e implementará políticas, planos, programas e ações com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada”.

  • Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN): surgiu em 1999, traz em seu texto diretrizes e ações que garantam o respeito, a proteção, a promoção e o acesso dos brasileiros à alimentação saudável.

  • Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE): criado em 1955, tem como objetivo fornecer alimentação saudável e educação nutricional a todos os alunos matriculados em escolas públicas.

  • Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT): instaurado pela Lei nº 6.321/76 e regulamentado pelo Decreto nº 5/91, o programa busca proporcionar alimentação saudável aos trabalhadores de baixa renda, com o objetivo de prevenir agravos e promover saúde entre os trabalhadores.

  • Programa de Aquisição de Alimentos (PAA): instituído pelo art. 19 da Lei nº 10.696/03, incentiva a agricultura familiar por meio da compra desses alimentos sem necessidade de licitação para instituições governamentais.

Portanto, o nutricionista contribui para a manutenção da saúde do povo brasileiro por meio da propagação de práticas alimentares positivas, que respeitem o meio ambiente e se adequem às singularidades socioeconômicas, fisiológicas, culturais e comportamentais de cada indivíduo.

REFERÊNCIA

1. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico Especial N58: Doença pelo Coronavírus COVID-19: Semana Epidemiológica 14 (4/4 a 10/4/2021). Brasília: Ministério da Saúde, 2021, n. 58, p. 93.

2. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde, 2013, p. 84.

3. BRASIL. Ministério da Cidadania. Secretaria Especial do Desenvolvimento Social. Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Disponível em: <Compras Governamentais — MINISTÉRIO DA CIDADANIA Secretaria Especial do Desenvolvimento Social (mds.gov.br)>. Acesso em: 31 mar. 2021.

4. BRASIL. Ministério da Economia. Secretaria de Trabalho. Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). Disponível em: <Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) — Português (Brasil) (www.gov.br)>. Acesso em: 15 abr.2021.

5. BRASIL. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e da outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 18 set. 2006. p. 1.

6. FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. ConVid Adultos: pesquisa de Comportamentos. Fiocruz: Rio de Janeiro, 2020. Disponível em: <https://convid.fiocruz.br>. Acesso em: 27 mar 2021.

7. HAMZE, Amelia. Programa Nacional de Alimentação Escolar. Brasil Escola. Disponível em: <Programa Nacional de Alimentação Escolar – Educador Brasil Escola (uol.com.br)>. Acesso em: 31 mar. 2021.

8. LOUZADA, M. L. C.; MARTINS, A. P. B.; CANELLA, D. S. et al. Alimentos ultraprocessados e perfil nutricional da dieta no Brasil. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 49, n. 38, 10 jul. 2015.

9. ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Alimentos e bebidas ultraprocessados na América Latina: tendência, efeito na obesidade e implicações para políticas públicas. Brasília: OPAS, 2018.

10. SCHMIDT, M. I.; DUNCAN, B. B.; SILVA, G. A. et al. Doenças crônicas não transmissíveis no Brasil: carga e desafios atuais. The Lancet, London, p. 61-73, 2011.

11. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Coordenação de Trabalho e Rendimento. Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018: avaliação nutricional da disponibilidade domiciliar de alimentos no Brasil. Rio de Janeiro, IBGE, 2020, p.61.

 

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