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Manejo odontológico ao paciente com Microcefalia | Colunista

Manejo odontológico ao paciente com Microcefalia | Colunista

RESUMO

Estudos mostram que os pacientes pediátricos com microcefalia no Brasil apresentam inúmeras alterações orofaciais, dentre elas hipoplasia da face média, face plana, hipotonia, lábio fino, palato atrésico, retrognatismo, desenvolvimento psicomotor atrasado, palato profundo, dimorfismo facial, doenças periodontais, traumatismos dentais. Estes pacientes necessitam de um correto manejo, técnica e condução adequada para cada caso, o que inclui também seus familiares.

Não há protocolo específico para o manejo odontológico do paciente com microcefalia, a tomada de medidas em condicionamento psicológico tem ajudado os profissionais na conduta com destes pacientes. No qual, necessita de mais estudos e desenvolvimento de profissionais qualificados.

INTRODUÇÃO

Microcefalia é uma desordem onde a circunferência da cabeça está com dimensões alteradas, no caso, perímetro cefálico menor que dois ou mais desvios-padrão do que a referência média para o sexo e idade ou período gestacional, acarretando estrutura cerebral alterada e problemas de desenvolvimento neurológico (DUDLEY et al., 2018).

Pacientes com microcefalia, de forma geral, apresentam calcificações cerebrais, atrofia cerebral, defeitos nas extremidades, incluído contrações congênitas e hipertonia. As alterações craniofaciais em destaque são: mal oclusão, problemas periodontais, alterações no palato, obstrução das vias aéreas, problemas de fonação, diminuição das dimensões da maxila e mandíbula (MARINHO et al., 2020).

O manejo odontológico do paciente portador de microcefalia é algo novo na odontologia, requer habilidades e exige inovação dos profissionais. O recente surto de microcefalia, no Nordeste brasileiro, provou a odontologia que é preciso entender melhor sobre essa alteração congênita e suas repercussões na cavidade oral, para atender da melhor forma, e assim promover saúde para esses pacientes (SIQUEIRA et al., 2020).

Pacientes de particularidades especificas requerem atendimentos diferenciados, entender não só a patologia como um todo, mas as singularidades de cada indivíduo. É fundamental que o profissional tenha conhecimento das técnicas de manejo que estão ao seu alcance para promover um atendimento seguro, fornecendo sucesso ao tratamento odontológico (AMARAL et al., 2019).

RESULTADOS

A microcefalia é uma condição congênita em que há redução significante na circunferência occipitofrontal da cabeça, comparando-se com valores de controle da mesma idade e gênero, o tamanho do crânio apresenta-se diminuído do considerado padrão, pois ocorre fechamento prematuro das suturas cranianas, conhecidas como fontanelas (RIBEIRO et al., 2017). Do ano de 2015 para os dias atuais, esta patologia tem ligação forte com o Zika Vírus (ZIKV) (LEITE, 2017).

Necessita de tratamento multidisciplinar, pois afeta várias áreas do corpo, desde a cabeça até os músculos. Na área odontológica, podem-se observar diversos achados dignos de tratamento e acompanhamento pelo cirurgião dentista (EICKMANN et al., 2016).

Microcefalia e Zika Vírus

O Zika Vírus é da família Flaviviridae, um flavivírus, transmitido pelo Aedes aegypti como a dengue e a febre amarela. Descoberto na África Oriental na década de 1950 e permaneceu infectando na África e no Sudeste Asiático. Em 2015, o vírus chegou ao Brasil por indivíduos infectados em outros países, que serviram como reservatórios para transmissão pelo mosquito Aedes aegypti (MLKLAR, 2016).

A infecção pelo Zika Vírus apresenta como manifestações clínicas mais comuns: exantema precedido de febre, fadiga e artralgias envolvendo pequenas articulações de mãos e pés. Em alguns casos é percebido conjuntivite bilateral não purulenta (BROGUEIRA, MIRANDA, 2017).

Mulheres que relataram a doença durante a gestação geraram crianças com defeitos congênitos e no sistema nervoso central. Ao ser identificado a presença do vírus no líquido amniótico de recém-nascidos, as ultrassonografias apresentavam microcefalia nos bebês (MLAKAR et al.,2016). Devido o aumento anormal do número de casos de recém-nascidos com alterações congênitas associadas ao Zika Vírus, passou-se a usar o termo Síndrome Congênita pelo Zika Vírus (SCZV) (MORO, MAREGA, ROMAGNOLO, 2019).

O grau de comprometimento pode variar entre os infectados, características como atraso no desenvolvimento, alteração da visão, distúrbios da fala e linguagem são comuns em quase todos portadores da SCZV (SIQUEIRA et. al., 2020).

Alterações orofaciais em pacientes com microcefalia

Estudos avaliaram as alterações no desenvolvimento orofacial em indivíduos com microcefalia, e relatam alterações na cavidade oral, como hipoplasia do esmalte em dentição decídua, esfoliação precoce dos dentes decíduos, aceleração da erupção dos permanentes, hiperplasia gengival, recessão gengival. Apresentam, geralmente, Classe II como padrão dentoesquelético, overjet, mordida aberta, microdontia, taurodontismo e displasia dentária (AMARAL, 2019; HAMAD, SOUZA, 2020).

Foram relatados diagnósticos de disostoses mandibulofacial, hipoplasias, alterações craniofaciais, micrognatia, assimetria facial. Alterações orofaciais como palato ogival, defeitos na estrutura do esmalte, alterações na cronologia e seqüência de erupção, comprometimento do crescimento craniofacial e dificuldades nas funções de mastigação, deglutição, fonação e a respiração (MARINHO, 2020) .

Segundo Leite e Varellis (2016) a desarmonia facial e maloclusões podem favorecer a ocorrência de cárie dentária e doenças periodontais. O comprometimento no desenvolvimento neurológico interfere na odontogênese resultando retardo na erupção e alterações de seqüência.

O padrão facial dolicocéfalo, selamento labial ausente, decorrente da hipotonia do lábio superior, lábio inferior hipotrófico e evertido, mordida aberta, convexidade facial aumentada, deficiência na expressão maxilar, distância encurtada entre o queixo e o pescoço e tendência à respiração bucal (FEITOSA, SCHULER-FACCINI, SAN SEVERINO, 2016; QUIRINO. et al., 2020).

Manejo odontológico

Requer do cirurgião dentista um manejo de atendimento diferente do habitual, para que o mesmo aconteça de uma forma tranquila. As técnicas de abordagem psicológica facilitam o tratamento odontológico desses pacientes, favorece a comunicação, controle da ansiedade e o medo da dor. São elas:

Dessensibilização: objetiva deixar o paciente em estado de relaxamento, mostrando-o gradualmente aos procedimentos odontológicos. É preciso preparar o ambiente odontológico, quanto mais conseguir simplificar a sala de atendimento, mais fácil será para o paciente focar em interações sociais e no que se quer conseguir em termos de colaboração deste paciente (CALDAS JR.; MACHIAVELLI, 2013).

Distração: introduzir ao ambiente estímulos agradáveis que tiram a atenção de elementos que causam medo ou tensão, e levar para situações imaginárias agradáveis. Essa forma de abordagem visa lidar com o controle da ansiedade, podendo ser realizada por meio de conversa sobre um assunto de interesse do paciente, como histórias, filmes de heróis, música, o que agradar o paciente (CARVALHO, 2012).

Dizer/mostrar/fazer: é explicar, de acordo com o nível cognitivo, utilizando uma linguagem fácil. Mostrar os instrumentos odontológicos, o procedimento que será realizado, e em seguida executá-lo. Deverá ser realizado cuidadosamente, para não gerar desconforto, o que prejudicaria sua resposta positiva ao tratamento odontológico (MARINHO et al., 2020).

Ludoterapia: utiliza brinquedos para a transferência da ansiedade, medo, vontades e expressões do paciente. Estudos afirmam que a criança se projeta nas atividades adultas de sua cultura e ensaia seus futuros papéis e valores através dos brinquedos. Assim, o objeto antecipa o desenvolvimento, e com ele a criança começa a adquirir a motivação, habilidades e atitudes necessárias à sua participação social (CALDAS JR.; MACHIAVELLI, 2013).

Existem também meios de contenção física, como a estabilização que é uma técnica de controle, que restringe os movimentos voluntários e/ou involuntários do paciente, diminuindo a possibilidade de estresse por falta de controle muscular, protege o profissional e o paciente. Impede a tentativa de fuga da experiência que o paciente percebe como desagradável. Pacientes com déficit intelectual severo ou movimentos involuntários, como paralisia cerebral, muitas vezes necessita-se lançar mão de várias técnicas de estabilização para manter o paciente na cadeira odontológica em condições favoráveis para a execução do procedimento (CALDAS JR.; MACHIAVELLI, 2013).

CONCLUSÃO

São observadas as alterações orofaciais que acometem os pacientes com microcefalia: palato ogival, padrão facial dolicocéfalo, alteração na cronologia e seqüência eruptiva, doenças periodontais. Esses desequilíbrios sugerem desarmonia do sistema estomatognático e podem comprometer a dinâmica do crescimento craniofacial. Ficou claro que é necessário chamar a atenção dos cirurgiões dentistas e equipes de saúde para os cuidados com os pacientes portadores de microcefalia, não só em relação aos problemas bucais, mas também o manejo correto, condução de técnica para cada caso.

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REFERÊNCIAS

AMARAL, B. A. Características oclusais de bebês com microcefalia associada ao vírus Zika. 2019. 90f. Tese (Doutorado em Ciências Odontológicas) – Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2019.

BROGUEIRA, P.; MIRANDA, A. C.. Vírus Zika: Emergência de um Velho Conhecido. Medicina Interna,  Lisboa , v. 24, n. 2, p. 146-153,  jun.  2017.

CALDAS JR, A. F.; MACHIAVELLI, J. L.Atenção e Cuidado da Saúde Bucal da Pessoa com Deficiência: protocolos, diretrizes e condutas para cirurgiões-dentista, Recife: Ed. Universitária, 2013.

CAMPOS, G. S.; BANDEIRA A. C, SARDI S. I. Zika vírus outbreak, Bahia, Brazil. Emerg Infect Dis., v.21, p.1885–6, 2015.

CARVALHO, R. W. F. et al. Ansiedade frente ao tratamento odontológico: prevalência e fatores predictores em brasileiros. Ciênc. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 7, jul., 2012.

DUDLEY, D. M. et al. Miscarriage and stillbirth following maternal Zika virus infection in nonhuman primates.Nature Medicine, p. 1, 2018.

EICKMANN, S. H., et al. Zikavirus congenital syndrome. Cad. Saúde Pública., v.32, n.7, Rio de Janeiro, 2016.

FEITOSA, I. M. L.; SCHULER-FACCINI, l.; SAN SEVERINO, M. T. V. Aspectos importantes da Síndrome da Zika Congênita. Boletim Científico de Pediatria, v. 5, n. 3, 2016.

HAMAD, G B. N. Z.; SOUZA, K. V. Síndrome congênita do Zika vírus: conhecimento e forma da comunicação do diagnóstico. Texto Contexto Enferm. vol.29,  Florianópolis,  2020.

LEITE, C. N.; VARELLIS, M. L. Z. Microcefalia e a odontologia brasileira. J. Health NPEPS. 2016; v.1(2): 297-304.

MARINHO, J. V. M., et al. Aspectos clínicos da cavidade oral de pacientes com a síndrome congênita do zika: revisão da literatura. DiversitasJournal, 5(1), 57-65. 2020.

MLAKAR, J. et al. Zika virus associated with microcephaly. N Engl J Med. v. 374, p.951-958, 2016. DOI: 10.1056/NEJMoa1600651.

MORO, J.S.; MAREGA, T.; ROMAGNOLO, F.U. Microcephaly caused by the Zika virus: dental care. Rev. Gaúch. Odontol. 2019, vol. 67, e2019001, ISSN: 1981-8637.

QUIRINO, E. M. B. et al. Perfil epidemiológico e clínico de casos de microcefalia. Enferm. glob.,  Murcia, v. 19, n. 57, p. 167-208, 2020

RIBEIRO, B. N. F. et al. Síndrome congênita pelo vírus Zika e achados de neuroimagem: o que sabemos até o momento?. RadiolBras, São Paulo,  v. 50, n. 5, p. 314-322,  Oct.  2017.

SIQUEIRA, R. M. P. et al. Dental care for children with Congenital Zika Syndrome. RGO, Rev. Gaúch. Odontol., Campinas,  v. 68,  e2,    2020.

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