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Eixo: Intestino-Cérebro: O que o psicólogo deve saber?

Eixo: Intestino-Cérebro: O que o psicólogo deve saber?

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Palavras-chave: disbiose, cérebro, intestino, ansiedade, microbiota intestinal, bactérias, serotonina, transtornos psiquiátricos, psicólogo, psicoterapia, flora intestinal, bactérias intestinais, cortisol.

Como psicóloga clínica e especialista em Ansiedade, sempre pensei que o caminho era exatamente a tríade, pensamento, emoção, comportamento, que nos levava a quadros ansiosos, embasado ainda em uma única vertente: a predisposição genética.

Sim, sabemos disso, e é assim que eu, Samara Fernandes, psicoeducava meus pacientes. Buscar explicar que a ansiedade existe, apenas porque existe e porque penso que ela existe, “enraizada” juntamente as questões genéticas, agregadas também ao combo das situações experienciais que vivemos ainda não nos levava ao desfeixe e eu sentia que eles buscavam e esperavam mais.

Busquei me aprimorar, e foi então que aprofundei a busca pelo conhecimento do corpo humano. E a minha principal pergunta era: Meu corpo sente essa emoção, mas meu cérebro não é o único responsável, então quem faria esse alelo, essa comunicação direta com a forma como me sinto? E nessa busca descobri alguns estudos como: Intestino, nosso segundo cérebro. 

Neste estudo, cientistas separaram ratos de laboratório em dois grupos, os que receberam iogurte com a bactéria Lactobacillus rhamnosus e o grupo que não continha essa bactéria. Ao fim do teste, os ratos que receberam a bactéria tinham nadado e atravessado o labirinto com muito mais disposição e aparentavam muito mais relaxados.

Em um exame de sangue foi visto que esses ratos tinham menos presença de corticosterona (hormônio ligado ao estresse) e melhor distribuição GABA – amínobutírico – responsável pela diminuição da ansiedade no organismo. Foi então que o neurocientista brasileiro Giliard Lach, condutor do estudo, concluiu que o cérebro tem ligação direta com intestino. Sugerindo ainda que no futuro, os antidepressivos poderiam ser comprados no mercado em forma de iogurte.

Mas afinal, o intestino interfere na forma como me sinto?

Sim, e não só interfere, como mantém ciclos desagradáveis por hábitos não saudáveis que pode ser relevante ao longo da vida auxiliando no processo dos transtornos mentais. Já percebeu que é muito comum pacientes com queixa de ansiedade e depressão também possuírem problemas intestinais?

No nosso intestino existe de 300 até 1000 espécies de bactérias. Essa variedade é muito importante, pois cada uma é responsável por uma função. Quanto menos povoado de bactérias boas, mais a chance do intestino se tornar permeável por substâncias tóxicas, nocivas ao organismo.  Não tendo uma qualidade boa de bactérias povoando o intestino, a produção de serotonina é afetada em consequência o seu precursor, o triptofano.

Existe uma comunicação direta entre cérebro e intestino, primeiro, porque o intestino é ligado diretamente pelo nervo vago até o cérebro, segundo, porque como visto em algumas pesquisas, nosso intestino detém de 90% da produção de serotonina do corpo. 

Para quem não sabe, a serotonina é responsável pelas seguintes funções:

  • Regulação do Sono;
  • Humor;
  • Regulação da temperatura corporal;
  • Sensibilidade;
  • Funções Cognitivas e outros.

Com a redução deste importante hormônio, o sistema aumenta a produção de cortisol que compromete ainda mais a produção de serotonina. O cortisol é um hormônio que auxilia na redução de inflamações, responsável pelo bom funcionamento do sistema imunológico, controla os níveis de açúcar e outros benefícios. Sendo de extrema importância para o nosso organismo, porem quando seus níveis se encontram desregulados, muito elevado, o efeito sobre o organismo é ruim, levando a problemas de sono, cansaço prolongado, imunidade baixa e irritabilidade.

Com o cortisol elevado o cérebro entende que precisa de recompensa para relaxar, estimulando a liberação de dopamina. E é nessa parte que entram os hábitos de cada um, que nos leva a ciclos infindáveis de ansiedade ou outros transtornos, pois como meio de recompensa muitos usam os meios menos saudáveis para acalmar "a máquina" geralmente comendo comidas saborosas em excesso (compulsão), bebida alcoólica, cigarro, entre outros. Hábitos estes que se tornam uma "bola de neve", pois desregulam a microbiota e consequentemente reiniciam todo o processo ansioso. 

Existe um meio de nós psicólogos quebrarmos este ciclo?

Sim, primeiro buscar em uma anamnese o estilo de vida do paciente, buscar entender se ele possui hábitos saudáveis. Iniciar com essas informações já leva o profissional a entender que aquele paciente pode estar colaborando com o processo psicopatológico.

Para isso é preciso: Identificar maus hábitos, Incentivar a modulação da microbiota intestinal (uma consulta ao nutricionista), que é um meio muito interessante de tratar a ansiedade em conjunto com a psicoterapia.

  • Adquirir hábitos saudáveis de alimentação;
  • Não consumir antibióticos em excesso;
  • Dormir nos horários corretos;
  • Não comer de madrugada (horário que o corpo deveria estar se recompondo e não digerindo comida);

São meios de regular a microbiota intestinal. Mas a forma que nós, psicólogos, podemos reverter o ciclo ansioso é mudando a forma de recompensa.

Por exemplo: Carla (nome fictício) tem a microbiota desregulada, por excesso de fast-food, comer chocolate em demasia, entre outros. Esses são hábitos de Carla, há muitos anos ela vive desse modo. Para mudar esse hábito quando a ansiedade chegar, ela irá comer algo mais saudável, algo que em conjunto com uma nutricionista possamos reduzir a ansiedade e promover a regulação intestinal dela.
Inicialmente Carla não sentirá prazer como se estivesse comendo um chocolate, mas a ideia é criar em Carla um novo hábito, faze-la comer maçã, por exemplo, por 21 dias (tempo estimado para se criar um novo hábito) até que o cérebro entenda que esse é seu
novo meio de recompensa. Quebrando o ciclo da baixa serotonina, picos de cortisol e compulsões. 

Incentivar o paciente a mudar o estilo de vida em prol da sua saúde é mostrar que tais mudanças lhe trará muitos benefícios para outras áreas da sua vida, mais autoestima e consequentemente mais prazer em viver. Mas isso ela só poderá experienciar na prática.  

O que meu paciente precisa saber?

Algo importante descoberto em várias pesquisas é que pessoas saudáveis, mas com estilo de vida ruim podem vir a desenvolver o transtorno. Os estudos são claros quanto a ideia de que o sistema gastrointestinal pode causar transtornos psiquiátricos, e o inverso também. Em alguns deles, inclusive, mostram que pacientes com predisposição genética a transtornos mentais, mas que ainda não desenvolveram nenhum tipo, podem desencadear através de uma disbiose (desequilíbrio da flora intestinal). Alertar é um papel importante, prevenir, é um papel importante do psicólogo.  

Por que eu, psicólogo, preciso saber disso?

Vejo que os pacientes esperam mais dos psicólogos, claro que não possuímos função de médicos, mas temos a neurociência ao nosso lado. Quando estamos embasados passamos mais credibilidade no tratamento. Independentemente da abordagem que seguimos nosso paciente gosta de ouvir que existem evidências, que existe segurança na nossa fala. Muitos de nós temos a necessidade de nos firmar em evidências, apesar de muitas vezes elas não existirem. Nem tudo pode ser explicado, mas aquilo que se pode, se deve!

Para quem trata pacientes com ansiedade, sabe que estes pacientes “alimentam” muitas crenças errôneas sobre o futuro e inclusive sobre a própria terapia. Ser científico é uma forma de reduzir a ansiedade deste paciente também.

Referências

VEDOVATO, K.; TREVIZAN, A. R.; ZUCOLOTO, C. N.; BERNARDI, M. D. L.; ZANONI, J. N.; MARTINS, J. V. C. P. O EIXO INTESTINO-CÉREBRO E O PAPEL DA SEROTONINA. Arq. Ciênc. Saúde Unipar, Umuarama, v. 18 n. 1, p. 33-42, jan./abr. 2014

BARROS ALMEIDA, L.; BASTOS MARINHO, C.; DA SILVA SOUZA, C.; BARBOSA PEREIRA CHEIB, V. DISBIOSE INTESTINAL. Rev. Bras. Nutr. Clin; UniBH, Belo Horizonte. 24 (1): 58-65, 2009.

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